domingo, 30 de novembro de 2008

Amo a recordação ....

Amo a recordação daqueles tempos nus

Amo a recordação daqueles tempos nus
Quando Febo esculpia as estátuas na luz.
Ligeiros, Macho e fêmea, fiéis ao som da lira,
Ali brincavam sem angústia e sem mentira,
E, sob o meigo céu que lhes dourava a espinha,
Exibiam a origem de uma nobre linha.
Cibele , então fecunda em frutos generosos,
Nos filhos seus não via encargos onerosos:
Qual loba fértil em anônimas ternuras,
Aleitava o universo com as tetas duras.
Robusto e esbelto, tinha o homem por sua lei
Gabar-se das belezas que o sagravam rei,
Sementes puras e ainda virgens de feridas,
Cuja macia tez convidava às mordidas!
Quando se empenha o Poeta em conceber agora
Essas grandezas raras que ardiam outrora,
No palco em que a nudez humana luz sem brio
Sente ele n'alma um tenebroso calafrio
Ante esse horrendo quadro de bestiais ultrajes.
Ó quanto monstro a deplorar os próprios trajes!
Ó troncos cômicos, figuras de espantalhos!
Ó corpos magros, flácidos, inflados, falhos,
Que o deus utilitário, frio e sem cansaço,
Desde a infância cingiu em suas gases de aço!
E vós, mulheres, mais seráficas que os círios,
Que a orgia ceva e rói, vós, virgens como lírios,
Que herdaram de Eva o vício da perpetuidade
E todos os horrores da fecundidade!
Possuímos, é verdade, impérios corrompidos,
Com velhos povos de esplendores esquecidos:
Semblantes roídos pelos cancros da emoção,
E por assim dizer belezas de evasão;
Tais inventos, porém, das musas mais tardias
Jamais impedirão que as gerações doentias
Rendam à juventude uma homenagem grave-
À juventude, de ar singelo e fronte suave,
De olhar translúcido como água de corrente,
E que se entorna sobre tudo, negligente,
Tal qual o azul do céu, os pássaros e as flores,
Seus perfumes, seus cantos, seus doces calores.

Charles Baudelaire

domingo, 9 de novembro de 2008

Desculpe a demora amigos .... essa vida corrida!!!!
Continuarei aqui com a seqüência dos romances de Erico Verissímo, estes que podem ser consideradas uma trilogia pois tem uma continuidade. As obras contam a trajetória da menina Clarissa, personagem principal de Erico que veêm para mostrar-nos em sua delicadeza de menina à moça a sociedade gaúcha da década de 30 e contam a história de uma família tradicional que vem degradando-se com os problemas sociais e políticos da época.
Deliciem-se ..... curtam o prazer de uma boa leitura... E o mais importante após a leitura desses pequenos trechos, concluam a sua descoberta na leitura da obra. Será um momento único em que vocês estarão em outro mundo ... O mundo prazeroso da literatura de qualidade!!!!!!
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Clarissa
Clarissa é a história límpida e serena de um ano de vida de uma criança que se faz mulher. "Na monotonia cotidiana da pensão de sua tia Zina", escreve um dos críticos que melhor compreenderam o sentido deste romance, "ela é um raio de sol, uma mancha rutilante de alegria. É a poesia da vida no meio do realismo mesquinho. Nela, tudo encanta porque tem a inocência que a angeliza, e o sabor das coisas naturais que ainda não sofreram as deformações da sociedade... Clarissa é qualquer coisa de agreste e puro. Clarissa é música e é poesia. Menina e moça - olhos abertos para o mistério sa vida. alma que amanhece."
Uma de nossas melhores novelas sobre a psicologia da adolescência, este livro tem como fundo a terra e a gente do Rio Grande do Sul.
“Érico Veríssimo principia com uma novela adocicada - Clarissa - da linhagem da Moreninha, Inocência e outras do gênero. Escrita em 1932, numa altura em que a ficção nordestina dava mostras de se engajar na luta social pela emancipação dos humilhados e ofendidos, é uma história suave, de uma adolescente sonhadora. Imprevista nos quadros da ficção moderna, onde predominava a prosa de 22 ou o regionalismo de Raquel de Queirós, José Américo de Almeida e outros, é quase uma narrativa para jovens. Expressão típica do Rio Grande do Sul, antípoda do Nordeste, de forma que Clarissa seria a contraface da protagonista dO Quinze? O certo é que a heroína de Érico Veríssimo é uma menina-moça romântica, que facilmente converte em lágrimas suas reações e pessoas e acontecimentos. Encarna o cotidiano simples duma cidade tranqüila e provinciana, a ponto de a narrativa se pretender sinônimo de vida.” (Massaud Moisés, História da Literatura Brasileira, O Modernismo, p. 224)
MÚSICA AO LONGE
Continuação do romance Clarissa. A vida que passa e o mistério da vida. As pessoas vão morrendoe Clarissa teme a velhice. O casarão passa de mãos em mãos. Clarissa quer segurar a sua juventude.E pensa também em seus alunos, que amanhã serão homens acabados. Nada é definitivo.Os Albuquerques, outrora senhores de Jacarecanga, são substituídos, política e socialmente, por umgrupo de imigrantes sem passado e sem tradição. O romance narra a decadência lenta e definitiva doantigo patriarcado social rio-grandense.
TRECHO:
O relógio da varanda bate dez horas. João de Deus abafa um bocejo. Tia Zezé cochila a um canto. DonaClemência tricoteia. Cleonice e "seu" Pio conversam e chupam caramelos naoutra sala. A noite vai ficando velha e nada aconteceu. Sem que Clarissa saibaexatamente por que, seus olhos ao menor ruído se erguem de repente e sefixam na porta, como se estivessem esperando a entrada de alguém. O serão se prolonga. Papai fala no irmão que se suicidou. Por uminstante a alma do afogado está presente. Depois falam da mãe de Vasco.Depois, em "seu" Leocádio. E todos os mortos vão chegando de mansinho esentam-se nas cadeiras vazias, tomando parte também no serão. E o relógio tique-taqueia. E quando se faz silêncio entre os vivos,são os mortos que estão falando. Até o tio Amâncio comparece em espírito,tossindo e acariciando o bigode ralo. Clarissa olha para as páginas da revista que tem nas mãos, olha, massem ver. E vai folheando à toa. Um ruído... E seus olhos se erguem para aporta. "Na próxima vez não olho, podem até bater. Que bobagem!" Mas estralauma viga e de novo os olhos de Clarissa se alçam. Fecha a revista, levanta-se, pede bênção aos pais, dá boa-noite aosoutros e sobe para o quarto. Agora ela vai subindo, calada, com medo até de pensar. Dentro do quarto encontra um doce intruso. O luar fresco de setembro,com perfume de madressilva e de junquilhos. Clarissa fecha a porta. Melhor não acender a luz, para não quebrar o encantamento. Vai até ajanela. A lua-cheia sobre Jacarecanga. A rua quieta. Uma corneta tocandolonge, num quartel. A presença silenciosa das estrelas. Cachorros uivando.Galos cantando.
UM LUGAR AO SOL
Vasco caminha pela vida numa incansável e persistente busca: de emprego, de amor, de dias melhores... Mas não importa. Já se habituou a viver em constante contradição. Busca as aventuras da boemia e descobre os prazeres de um viver regrado. Como será o amanhã? Não se sabe... Há dificuldades imensas, mas é certo que também existe Clarissa, sua paixão, o elo que o prende à realidade. A vida ainda vale a pena! Permanecer e lutar ou ganhar mundo com seu pai, num percurso solitário?
Erico Verissimo consegue, neste livro contundente e atual, mostrar que, apesar dos pesares que marcam o destino inexorável do homem, todos nós temos direito a Um Lugar ao Sol. Neste livro, o escritor consegue elaborar de modo impecável um retrato vivo da complexidade do ser humano e das questões que o inquietam. Reunindo personagens já conhecidas de suas obras anteriores, coloca-as a nu, com uma linguagem sincera e comovente, criando situações em que o cotidiano se impõe sempre, implacável.
Assim, à miséria e à violência que marcam o destino do homem, somam-se aspectos do mais profundo humanismo: a solidariedade irrestrita, a esperança de uma vida melhor, a amizade, a paixão.Sempre crítico, o autor analisa a sociedade procurando compreendê-la de forma realista, isenta. E as personagens, vivendo o presente intensamente, ao sabor dos acontecimentos, não se preocupam com o amanhã. É melhor "seguir ao acaso, como os barcos antigos, sem bússula nem porto certo, guiados apenas pelas estrelas". Com uma temática atual e forte, o enredo envolve o leitor e leva-o a refletir sobre o próprio destino, seus encantos e desencantos, sua impotência e pequenez frente à vida.

sábado, 1 de novembro de 2008

Erico Verissímo

Trago aqui um pouco sobre o escritor gaúcho de maior sucesso na década de 30 entre os romances da sua geração. Erico Verissimo escreveu várias obras e muitas delas foram adaptadas para novelas. Quem já conhece, fica mais uma oportunidade de continuar lendo-o ... já quem não conhece, fica aqui uma ótima dica de leitura. No fim falarei um pouco de umas obras mais emocionantes: Olhai os Lírios do Campo. Leiam!! Vocês irão adorar!


A obra de Erico Veríssimo, para fins didáticos, pode ser dividida da seguinte maneira:

Romances Urbanos - São aqueles em que o Assunto gira em torno do cotidiano das grandes cidades como a crise da sociedade moderna e a falta de solidariedade etc.
Fazem parte desse grupo os Romances: » Clarissa - 1933; » Caminhos Cruzados- 1935;» Música ao Longe - 1935;» Um Lugar ao Sol - 1936;» Olhai os lírios do campo - 1938;» Saga - 1940;» O Resto é Silêncio - 1942;» Noite - 1954

Romances Históricos - São aqueles em que Érico Veríssimo monta um verdadeiro painel histórico do Rio Grande do Sul, abrangendo as formações sociais, políticas e econômicas.
Fazem parte desse grupo:» O tempo e o vento - trilogia épica, dividida em:
- O continente (1945) - engloba o período que vai do século XVIII até 1895;- O retrato (1951) - retrata as primeiras décadas do século XX;- O arquipélago (1961) - vai até o governo Vargas.

Romances Políticos - São aqueles que gravitam em torno da política contemporânea ao período em que Érico Veríssimo viveu.
Fazem parte desse grupo as obras:
» O Senhor Embaixador - 1965; » O Prisioneiro - 1967; » Incidente em Antares - 1971.


Literatura Infantil e Juvenil » A Vida de Joana D'Arc (1935) - literatura infano-juvenil» As Aventuras do Avião Vermelho - 1936;» Os Três Porquinhos Pobres - 1936;» Rosa Maria no Castelo Encantado - 1936;» Meu ABC - 1936; » As Aventuras de Tibicuera (romance didático) - 1937;» O Urso com Música na Barriga - 1938; » A Vida do Elefante Basílio - 1939; » Outra Vez Os Três Porquinhos - 1939; » Viagem à Aurora do Mundo - 1939; » Aventuras no Mundo da Higiene - 1939;» Gente e Bichos - 1956.

Contos» Fantoches, 1932

Viagem» Gato Preto em Campo de Neve - 1941;» A Volta do Gato Preto - 1946; » México - História de uma viagem - 1957; » Israel em Abril - 1969.

Memórias» Solo de Clarineta I - 1973;» Solo de Clarineta II - 1976; nota: as datas das obras referem-se ao ano de publicação


Olhai os lírios do campo é um dos romances mais famosos de Erico Veríssimo. Um verdadeiro best-seller que resultou até em novela na Argentina. A narrativa da primeira parte é feita em flashback. Eugênio vai lembrando de momentos da sua vida enquanto se dirige ao hospital onde está Olívia.
Eugênio era um menino tímido e medroso. Teve uma infância pobre, era ridicularizado na escola e tinha como objetivo máximo a ascensão social, faria de tudo para um dia vencer na vida. Achava que o que tinha era feio e sem graça, das roupas até o seu próprio corpo. Não se entrosava com os demais colegas de classe e por isso devotava todo o seu tempo aos estudos. Sonhava em deixar de ser simplesmente o Genoca para ser o Dr. Eugênio Fontes.
Tinha pena do pai, o alfaiate Ângelo, com quem não conseguia se comunicar facilmente. O seu irmão, Ernesto, não esmerava-se na educação e acabou perdido na vida. Com muito esforço, Eugênio consegue cursar Medicina. Na Faculdade conhece Olívia - única mulher da turma. Na festa de formatura os dois se aproximam e fazem sonhos e confissões juntos, sobre o futuro. Tornam-se grandes amigos.
Durante a revolução de 30, após uma operação mal sucedida no hospital militar, Olívia convida Eugênio a sua casa e passam uma noite de amor. Dias depois, Olívia recebe uma proposta para trabalhar em Nova Itália, e novamente se entrega aos braços de Eugênio.
Durante um atendimento médico, Eugênio conhece Eunice Cintra - filha de um riquíssimo proprietário. Eugênio casa-se com Eunice com objetivo único de ascender socialmente. O sogro trata de arranjar um emprego de fachada ("assinar documentos") numa de suas fábricas. Eugênio começa a freqüentar a alta sociedade, mas não se sente parte dela. O seu complexo de inferioridade aumenta ao ver os contrastes desse outro mundo, de emoções contidas, de meias-palavras. Conhece pessoas como Filipe Lobo, construtor obstinado a construir o "Megatério", um arranha-céu, mas não se importava com a família. Infeliz e perturbado, Eugênio reencontra Olívia que lhe apresenta a sua filha, fruto do último encontro dos dois, Anamaria. Ao chegar no Hospital onde estava Olívia, recebe a notícias de sua morte.
A segunda parte passa-se após a morte de Olívia e é intercalada com a leitura das cartas que ela escreveu para Eugênio sem nunca ter enviado. Eugênio toma coragem e separa-se de Eunice - apesar de todos os incovenientes sociais. Vai além, passa a ser um médico popular, com idéias de socializar a medicina. Trabalha com o Dr Seixas, um velho médico que sempre atendeu aos pobres. A memória de Olívia, nas cartas, nas fotos ou no olhar de Anamaria, o fortalece quando pensa nas dificuldades.
O original da obra, com correções a mão feitas por Erico Veríssimo, encontra-se hoje na gigantesca biblioteca de José Midlin.


Para melhor explicar a obra "Olhai os Lírios do Campo", nada melhor do que as palavras do seu próprio autor. Leia :

http://www.mundocultural.com.br/index.asp?url=http://www.mundocultural.com.br/literatura1/modernismo/brasil/2_fase/erico_verissimo/SINOPSES.shtml